sexta-feira, agosto 04, 2006
A medida em que formos percorrendo as ruas semi-penumbradas da cidade calada não nos ocorre toda a solidão que vivemos. As ruas estão mortas. Ninguém testemunha nossa silenciosa peregrinação. Buscamos os lugares que roubam nossas recordações: "Naquela praça cai da bicicleta uma vez" ou "Naquele banco, alguém morto me roubou um segredo...".

A cidade têm fantasmas. Eu tenho medo de continuar a percorrê-la. Você me diz pra continuarmos, quer ver onde toda a vida no Universo começou e me diz que é bem ali depois da esquina debaixo de uma mangueira seca. Tenho muito medo dos fantasmas. Pessoas, bichos, casas, cheiros: todos fantasmas. Todos mortos.

Ali era a casa e não é mais...agora é um escritório e minha infância inteira está sepultada ali naquelas paredes.Dá vontade de chorar eu te digo porque quero trazer a cor de volta das manhãs perdidas do mês de Julho e de brincar de polícia e ladrão e me esconder de novo na batcaverna e ser preso em um calabouço enquanto os Comandos em Ação vem eliminar o Comandante Cobra temos que ser rápidos antes que nos chamem para o lanche ou para tomar banho meu deus tomara que tenha biscoito com geléia de mocotó e sabe de uma coisa ontem mesmo eu aprendi a andar de bicicleta no jardim lá de trás vem ver só como eu ando sem rodinhas! E vejo também todos os bolos os brigadeiros os doces e todas as velas de aniversário e todos os anos que passam na casa fantasma doem até o dia em que eu saio pelo corredor e quando volto na outra semana você está em cima da cama e não respira mais e eu choro sozinho com você no quarto e a casa está morta também mesmo cheia de gente olhando para os lados e dizendo "sentimentos" e "pêsames" e eu não sou mais criança há muito tempo só quero ser mas não consigo. Você está deitada num caixão na sala e sua criança chora em você e diz que não tem mais com quem brigar. Eu só escrevo num pedaço de papel todo o meu coração e coloco na sua mão que ainda tem um pouquinho de calor. Você cheira a talco de Vinólia. Meu deus nunca mais quero sentir esse cheiro de novo porque é o cheiro de minhas lágrimas é o cheiro das manhãs de julho é o cheiro de tudo o que está perdido tão perdido e que não volta, tá quebrado, tá quebrado.

Este texto foi escrito e deve ser lido ao som de "Harrowdown Hill" de Thom Yorke - (Pegue Aqui:http://rapidshare.de/files/28151946/08-thom_yorke-harrowdown_hill.mp3.html )
 
posted by -=|K¡ðÐ|=- at 9:23 AM |


0 Comments: